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quinta-feira, 29 de novembro de 2012

“Brandas” da Peneda: construir (n)a Sazonalidade


 “Brandas” da Peneda: construir (n)a Sazonalidade

Nas últimas décadas assistimos, devido a diversos factores (sobretudo culturais e tecnológicos), a profundas alterações na relação do homem com o território. As zonas rurais e de baixa densidade, habitu
almente mais conservadoras, guardiãs de arcaísmos potenciados pelo isolamento a que tradicionalmente estavam sujeitas, não foram excepção e, nas últimas décadas essas mesmas alterações fizeram-se sentir, seja através da mutação dos tradicionais sistemas económicos profundamente ligados à terra, seja através do desmembramento de ancestrais rituais comunitários ou, na grande maioria dos casos, através do abandono do território, visível no envelhecimento populacional e desertificação de grandes áreas. Assistiram-se, dessa forma, em escassas décadas a alterações de grande escala, abandonando-se seculares relações entre homens e destes com o espaço que habitam.

Perante o abandono/alteração das práticas agro-pastoris, o turismo aparece, hipoteticamente, como uma alternativa económica para estes espaços. Entendemos, no entanto, que ele deve ser entendido muito mais além daquilo que é a tradicional noção de “turismo” (como simples acto de lazer); pode e deve ser entendido como uma via cultural, forma de conhecer a arte e cultura das diversas sociedades através do contacto directo com estas e, sobretudo, com os territórios que povoaram.

Nesse sentido, entendemos que através do território e da arquitectura, elementos permanentemente definidores de identidades, teremos duas importantes componentes para melhor conhecermos as comunidades que o habitam/habitaram e/ou construíram. Acresce por isso mesmo a importância de reflectir sobre o território; conhecê-lo, percorrê-lo; estudá-lo, compreender e divulgar as suas formas e características, construindo dessa forma bases teóricas sólidas, alicerçadas no conhecimento, que permitirão intervir de forma consciente, recuperá-lo, mantendo-o assim como um importante testemunho histórico das comunidades que ao longo dos séculos nele intervieram. Reconhecer as especificidades e valores próprios de cada território e das relações que estabelecem (de semelhança e/ou diferença) com os territórios que o rodeiam será impreterivelmente a forma de selecionar devidamente os elementos que eventualmente o potenciarão.

Foi com base nestes pressupostos teóricos iniciais que desenvolvemos o trabalho, aplicando-os a um local específico, a Serra da Peneda. Como objectivos principais do trabalho devemos salientar o de conhecer este território e a sua arquitectura, assim como compreender as razões da sua conformação, através da interligação entre os factores históricos, económicos e culturais que lhe estão subjacentes. Como ponto de partida tínhamos, ainda, a vontade de salientar e investigar aquela que é a maior especificidade do território em análise, ou seja a sazonalidade da sua ocupação, materializada através da constituição das denominadas “brandas”.

Construir a sazonalidade / Construir na sazonalidade:

a) A conformação territorial da sazonalidade, resultado da relação do homem com o território, surge claramente como resposta às condicionantes geográficas (relevo, altitude, clima) bem como às necessidades de incremento da produção agro-pastoril. Através da prática da transumância vertical, em moldes similares a outras regiões astur-galaico-portuguesas (noroeste peninsular), como por exemplo as “brañas” das Astúrias ou os currais da Serra do Leboreiro, Serra Amarela ou Serra do Gerês, construiu-se um território de sazonalidades, materializado através da construção de distintos espaços. À implantação de lugares de habitação permanente (aldeias) em torno do maciço central da serra associou-se a implantação de outros complementares, de exploração sazonal estival, destinados à realização de actividade agrícola, pastoril ou mista, as “brandas”, localizadas geralmente a cotas superiores.

b) Construir na sazonalidade – as construções erigidas nas “brandas”, arquitecturas da transumância, relacionam-se intimamente com as condicionantes do uso – sazonal – e do isolamento do local. O primitivismo das construções é característico das actividades a elas relacionadas (agricultura e pastoreio). Denotando-se uma clara distinção, gradação de escala, das técnicas construtivas utilizadas, da presença/ausência de elementos decorativos ou simbólicos, variando todos estes factores conforme estejamos a falar de edifícios localizados em áreas de uso sazonal ou permanente.

Arquitectura e Território; Forma e Função, fundem-se assim em peculiares construções, síntese clara de todos os valores arquitectónicos supracitados. O conhecimento destas realidades será essencial para a valorização cultural deste património e do seu potencial turístico-cultural, materializável quer através da simples visita, quer de uma estada mais prolongada no tempo. Deve-se, portanto, conhecer e ter em atenção as diversas características arquitetónicas, nomeadamente no que diz respeito às peculiares técnicas construtivas, à materialização da globalidade das construções ou à espacialidade e ambiências características. Corretamente utilizadas potenciarão este património concreto, construído ao longo de gerações, valorizando, neste tempo de mudança e de globalização, a especificidade e diferença deste território em relação aos demais.